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07/06/2005 - O MOUSE CONTRA OS RATOS - O governo acerta ao exigir o pregão eletrônico nas compras públicas |
O combate à corrupção no Brasil depende de decisões firmes, mas nem sempre complexas. Na semana passada, o presidente Lula tomou um delas ao tornar obrigatório o uso do pregão eletrônico para reduzir as falcatruas e baratear o custo das compras governamentais, hoje em torno dos 15 bilhões de reais. A medida, que visa a substituir as licitações tradicionais na metade das contratações do governo, é altamente meritória. Um estudo da ONG Transparência Internacional revela que, a cada 100 reais que o governo precisa gastar, 68 só saem dos cofres públicos com licitação. E é na hora de contratar serviços ou comprar produtos que a corrupção mais aparece. Uma outra pesquisa mostra que metade das empresas que já participaram de alguma licitação foi pressionada a pagar propina e combinar preços antes de entregar sua proposta oficial ao governo. Os acordos fechados por baixo do pano sugam dos cofres públicos 25% a mais do que o preço de mercado. Vários estados brasileiros já usam com sucesso o sistema de pregões em substituição às licitações. Em São Paulo, onde o sistema não é totalmente eletrônico, a economia chegou a 1,7 bilhão de reais em um ano e meio. Em Minas Gerais, o governo poupou 350 milhões de reais no último ano. Ao menos outros cinco governos estaduais já introduziram o sistema. No plano federal, o modelo existe há mais de quatro anos, mas, como não era obrigatório, os gestores públicos optavam pelo processo tradicional. Sem a obrigatoriedade de usar a internet, o pregão eletrônico respondia por apenas 500 milhões de reais em compras federais. Segundo o Ministério do Planejamento, esse número pode agora chegar a 8 bilhões de reais. A economia esperada é de 700 milhões de reais por ano. México, Estados Unidos, Chile, Coréia do Sul, França e Austrália usam intensamente o sistema eletrônico. É por essa razão, entre outras, que a maioria desses países tem índices de corrupção bem menores que os do Brasil. Quanto mais transparente e democrático for o sistema de compras públicas, menos espaço haverá para a corrupção. O modelo tradicional perpetuou na administração pública as negociatas para superfaturar preços e direcionar as compras para fornecedores dispostos a corromper. Isso ocorre por problemas inerentes ao sistema tradicional, que inexistem no eletrônico. Nos pregões, empresas de qualquer lugar do país podem se cadastrar no site oficial de compras do governo federal, o www.comprasnet.gov.br. Um link à esquerda da página leva o interessado direto ao cadastramento. Preenchido o formulário, o empresário precisa imprimi-lo e entregá-lo numa das 2000 unidades da administração federal espalhadas pelo país. Ele receberá uma senha e será informado por e-mail toda vez que o governo fizer um pregão. Também poderá acompanhar a agenda de compras no próprio site. A burocracia não acabou, mas é um esforço bem menor do que se deslocar de uma cidade no interior do país para a sede de um órgão público em Brasília, por exemplo. Por permitir uma quantidade maior de participantes e impedir que um descubra a identidade do outro, o sistema eletrônico dificulta as negociatas. Além disso, durante o leilão, as empresas podem reduzir seus preços se um concorrente apresentar uma proposta mais barata. “É impossível garantir que o sistema seja imune a fraudes, mas o número maior de empresas impossibilita negociatas entre elas e com o agente público“, afirma Arnaldo Madeira, secretário da Casa Civil do estado de São Paulo. O leilão eletrônico é o sistema mais adequado para a compra de produtos como carros, medicamentos, material de escritório, conservação de elevadores e outros serviços com ampla gama de fabricantes e prestadores. Pode haver muita oferta no mercado, fica fácil saber qual o preço justo da mercadoria. O Sistema Único de Saúde, por exemplo, já fez as contas e descobriu que o custo dos medicamentos cairá de 8,5 bilhões para 6,8 bilhões de reais. De olho na economia e na maior transparência que o sistema permite, o governo federal decidiu dar um choque de realidade na administração pública. A partir de julho, quem não comprar pela internet terá de apresentar uma justificativa plausível. Mas, apesar da inquestionável melhora em relação ao sistema antigo, o pregão eletrônico não pode ser tratado como uma panacéia capaz de eliminar a corrupção. Metade de tudo o que o governo compra e contrata ainda se fará por concorrência pública. São as milionárias obras de engenharia, como construção de hospitais e escolas. As vantagens do pregão eletrônico beneficiavam há tempos o setor privado. O comércio eletrônico entre empresas já movimenta 150 bilhões de reais por ano no Brasil, e boa parte disso vem dos leilões pela internet. “No setor privado, pregões pela internet entre empresas deram certo porque as regras são claras e valem para todos. Além disso, quando um produto ou serviço é ruim, o fornecedor não participa das próximas negociações. Não tem por que se diferente no setor público“, analisa Marcello Póvoa, especialista em internet. O próximo passo do governo é abrir os pregões às empresas internacionais. Hoje, elas precisam ter cadastro em alguma junta comercial brasileira, o que limita o universo de concorrentes estrangeiros. Completa Daniel Kaufmann, diretor de governança pública do Banco Mundial: “Tão vital quanto adotar o sistema eletrônico é abrir as compras governamentais ao exterior. Não adianta apenas ser eletrônico, é preciso acabar com a reserva de mercado para as empresas nacionais“. O governo ainda está estudando essa mudança. |
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